Artigo escrito por Fabiana Gutierrez, nossa CEO, a convite do Luciano Lannes para a Revista Coaching Brasil, Edição 138.
Diversidade, Equidade, Inclusão e Pertencimento: O Poder Transformador das relações
Falar sobre diversidade é, na essência, falar sobre as relações. A diversidade está presente em todos os aspectos da vida e não se trata apenas de aceitá-la ou não; é uma questão de como cada indivíduo escolhe vivenciá-la em sua totalidade. Ao olharmos para a natureza, observamos a riqueza e a complexidade do mundo em que vivemos. Não poderia ser diferente em nossa sociedade. Nela, a diversidade refere-se a uma vasta gama de características que tornam cada pessoa única, incluindo, mas não se limitando a diferenças de raça, etnia, gênero, orientação sexual, idade, religião, deficiência, nacionalidade, níveis educacionais, classe social e status socioeconômico.
No entanto, se somos diversos por natureza, por que precisamos discutir este tema? A resposta é simples: vivemos em uma sociedade que historicamente tem sido construída com base em padrões que ignoram ou marginalizam o que não é igual a eles. Apesar de reconhecermos que a diversidade é uma realidade, dependendo das características que uma pessoa tem, ela pode ocupar um lugar diferente em termos de oportunidades dentro da sociedade e sofrer preconceito, segregação e/ou injustiças sociais profundas simplesmente por ser quem é.
Traçando uma linha do tempo, especialmente no Ocidente, podemos observar que a influência da sociedade grega e romana teve um peso significativo na formação das estruturas sociais atuais. Essas civilizações, em sua busca pelo poder e expansão territorial, frequentemente elevavam um ideal de corpo e mente, resultando na exclusão de determinados grupos. Mulheres, pessoas escravizadas e diferentes etnias eram constantemente afastadas das esferas de poder e participação cívica, sem contar as pessoas com deficiência que eram mortas na maioria das vezes. Na Idade Média, isso se intensificou com a formação de feudos e hierarquias rígidas, onde a mobilidade social era quase inexistente. Com o advento da colonização, populações indígenas e africanas foram brutalmente excluídas e segregadas com base em suas características raciais e culturais, experimentando políticas de marginalização que negavam seus direitos básicos. Sem contar o apagamento da cultura, tecnologia, personalidades e tantas outras conquistas destas pessoas.
O conceito de integração começou a surgir no fim do século XIX e início do século XX, quando movimentos sociais passaram a clamar por melhorias nas condições de vida. A luta pelo acesso à educação e participação pública surgem com mais força, especialmente em contextos de movimentos trabalhistas e de direitos civis. Contudo, a integração não significava aceitação plena. Muitas vezes, essa integração implicava na assimilação de grupos minoritários a padrões majoritários, sem espaço autêntico para a diversidade e o reconhecimento das diferenças que cada grupo trazia consigo.
Foi somente na segunda metade do século XX que vemos um movimento para a inclusão. Após a I e II Guerra, surgem movimentos pelos direitos civis, legislações como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) e a Lei dos Direitos Civis nos Estados Unidos (1964) representando avanços significativos e estabelecendo que os direitos iguais são essenciais para todos(as), independentemente de suas características pessoais. A inclusão começou a aumentar tanto na esfera educacional quanto na profissional, trazendo a necessidade de adotar práticas que permitissem a participação plena de todos os grupos da sociedade.
Mas para essa inclusão é preciso adicionar equidade a essa equação. Muitas vezes confundida com igualdade, a equidade vem reforçar o direito de ser diferente. Enquanto a igualdade busca garantir que todos tenham acesso aos mesmos recursos e oportunidades, como educação, saúde, emprego e justiça, a equidade leva em consideração as necessidades e circunstâncias individuais. Sempre gosto de me usar como exemplo, sou uma mulher de 1,51m. Imagine que precise trocar uma lâmpada. Talvez um banquinho não seja suficiente, precisarei de uma escada. Ter acesso a essa ferramenta me torna capaz de executar a tarefa da mesma maneira que uma pessoa que precisa apenas do banco.
Reconhecendo a diversidade e trazendo a equidade para uma melhor inclusão não seria o suficiente? Recentemente, o conceito de pertencimento se tornou ainda mais relevante. Pertencimento não é apenas um sentimento de aceitação, mas envolve a valorização das identidades únicas dentro das coletividades. Organizações e comunidades têm reconhecido a importância de criar ambientes onde as vozes de todos os indivíduos sejam ouvidas e respeitadas. Esse sentimento de pertencimento é fundamental para promover uma inclusão verdadeira, em que cada pessoa não só é integrada, mas também se sente uma parte ativa e valorizada na sociedade.
Muitos gostam de usar uma metáfora que diz: “Diversidade é convidar para a festa, inclusão é convidar para dançar”. Esta frase é da Vernã Meyers, na época Vice- Presidente de Diversidade e Inclusão da Netflix. A provocação é um excelente começo, pois muitas pessoas sequer são consideradas em alguns espaços. Porém, estamos dizendo que este(a) convidado(a) tem que dançar a música que está tocando, ou seja, já existe um padrão definido no qual ele(a) tem que se adequar. De vez em quando é ótimo, uma oportunidade incrível de conhecer algo que não conheço. Mas será que deixamos tocar outras músicas também no nosso baile?
William R. Torbert, professor da Carroll School of Management, em Boston (EUA), e autor de diversos livros, desenvolveu o conceito de “pertencimento mútuo”; ou “pertencimento relacional”, que se refere à sensação de se sentir totalmente envolvido e conectado com os outros membros de um grupo. Torbert argumenta que o pertencimento mútuo é fundamental para o desenvolvimento humano saudável e para a construção de relacionamentos positivos. Fazer parte de um grupo ou pertencer a um lugar nos proporciona um sentimento de importância, de fazer parte de algo maior e mais importante do que nós mesmos. Não se sentir parte de algo, por outro lado, pode ter efeitos negativos na saúde física e mental e no bem-estar de uma pessoa.
Mas o que é esse sentimento de pertencimento? É a percepção de alguém de ser parte de uma comunidade, de uma família, de um grupo, ou de uma nação. Está intimamente ligado ao reconhecimento e a como uma pessoa tem sua dignidade, cultura e diferenças respeitadas, poder se sentir acolhido nos espaços, ver suas ideias serem consideradas e perceber que tem influência naquele ambiente. Enfim, reconhecer e ser reconhecido.
O pertencimento é talvez uma das necessidades humanas mais importantes. Ninguém consegue viver bem se não sentir que pertence a algum grupo.
E esta pauta é para nos ajudar a refletir como podemos contribuir para que qualquer pessoa se sinta pertencente. O senso de pertencimento faz com que cada um, não só entenda seu papel naquele ambiente, mas como queira contribuir de forma legítima para ele, estando altamente ligado ao desempenho das pessoas.
Dentro deste contexto, em 2022, a Bain Company publicou o resultado de uma pesquisa sobre pertencimento nas organizações (O Tecido do Pertencimento: Como Tecer uma Cultura Inclusiva – tradução livre). Neste estudo, o pertencimento aparece diversas vezes demonstrando que sem pertencimento, não há conexão. O estudo traz que as pessoas que não sentem que estão em um ambiente inclusivo no local de trabalho são 6 vezes mais propensas a buscar outro emprego.
Falar sobre diversidade não é buscar culpados(as), nem tão pouco paralisar diante dos desafios. Falar sobre diversidade é falar sobre ser humano e sobre nossas relações. Há uma frase do filósofo e teórico político irlandês Edmund Burke que diz que ‘um povo que não conhece a sua história, está fadado a repeti-la’. Muito provavelmente a maioria das pessoas conseguem enxergar os absurdos e violências ao longo da nossa história na Terra. Negá-los e ignorá-los não farão com que se apaguem, farão com que, provavelmente, passemos a repeti-los, o que é inadmissível.
Diversidade não é uma batalha entre nós e eles. Não há eles. Somos nós. O desafio está em olhar nossa trajetória individual e nos ver dentro dessa diversidade, com os privilégios ou desprivilegios que temos, espaços de poder ou opressão que ocupamos. Mas o principal é que não existe ninguém menos importante nesse tema.
Artigo escrito especialmente a convite do Luciano Lannes para a Revista Coaching Brasil – ed 138
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