Aqui em Carlotas, estamos o tempo todo buscando novas maneiras de acessar o universo lúdico para transformar as relações. Foi assim que conhecemos o Fernando Tsukumo, um dos criadores do nosso primeiro jogo.
Ele é o idealizador da Sua Vez, uma consultoria que trabalha a educação através dos jogos de tabuleiro. Aproveitamos para compartilhar um pouco do que ele sabe sobre a arte de jogar e a sua importância no desenvolvimento social, cognitivo e perpetuação de valores e conceitos.
Have fun!
É bem comum a noção de que jogos educativos são chatos. E acredito que, em grande parte, essa noção reflete uma realidade. Basta olhar a seção educativa de qualquer lugar que seja dedicado a jogos. É como se houvesse uma licença não explícita, porém muito presente, de que jogos educativos podem ser menos divertidos ou desafiantes. Talvez porque quando, normalmente, se pensa em educação, nunca a associamos a diversão ou prazer.
Mas, ainda assim, tentamos justificar que seriam mais divertidos do que fazer exercícios tradicionais na sala de aula. Mesmo que possamos concordar com isso, temos que lembrar que se queremos que o momento de aprendizado seja maximizado, o ideal seria que o aluno jogasse também fora da sala de aula. E é aí que o argumento cai. Quando se compara os jogos educativos com outras atividades disponíveis, invariavelmente, eles acabam perdendo a batalha. Além disso, esse argumento traz embutida a noção, um tanto quanto antiga, de que materiais escolares têm a licença para, ou pior, são necessariamente chatos. Talvez por isso estejamos vivenciando essa crise educacional. Não só brasileira, mas mundial.
Isso acontece, na maioria das vezes, porque esses jogos são criados por pessoas incrivelmente bem intencionadas que, em geral, têm um bom domínio do conteúdo a ser trabalhado mas que desconhecem que existe um saber de criação de jogos.
Obviamente não é culpa desse profissional, mas sim da pouca cultura de jogos que temos no Brasil. Jogos clássicos como War, Banco Imobiliário e Jogo da Vida têm, respectivamente, 50, 100 e 150 anos. Não é exagero quando digo que esses jogos estão para os jogos de tabuleiro modernos assim como o nosso saudoso atari está para o PS4.
A quantidade de novas ideias, conceitos, teorias educacionais e mecânicas que os jogos de tabuleiro modernos incorporaram fazem com que os jogos clássicos – antes muito divertidos e que tomaram noites inteiras de diversão – pareçam realmente peças antiquadas de museu.
Sempre que me perguntam o que devem fazer para criar bons jogos a resposta que dou é a mesma: Jogue, jogue, jogue. No curso de criação de jogos de tabuleiro que conduzimos no Sua Vez, metade do tempo do curso é dedicado apenas a jogos, para aquisição de repertório e contato maior com as mecânicas existentes. O resultado é instantâneo e certeiro: pouco tempo depois, os alunos passam a reconhecer as diferentes mecânicas e utilizá-las em seus jogos.
É claro que nada disso se garante por si só. A mediação é fundamental para assegurar que isso ocorra. No entanto, ter bons jogos facilita em muito o processo de aprendizagem e se partirmos do pressuposto que praticamente qualquer jogo pode ser educativo com uma boa mediação. A questão é apenas saber escolher o jogo e trabalhar os seus potenciais educativos, fazendo valer a frase: “um jogo educativo nem sempre é divertido, mas um jogo divertido é sempre educativo”. E assim, uma miríade de competências, habilidades, saberes e, principalmente, valores serão trabalhados pelos mais diferentes jogos. Com isso, expandem-se os horizontes de aplicações de jogos de tabuleiro na sala de aula, potencializa as oportunidades de aprendizado criadas e as estende para fora da sala de aula com os próprios alunos tomando a iniciativa de jogar.
É a situação ideal que todo o professor sonha: Alunos sendo protagonistas de seu próprio aprendizado. Os próprios alunos aprendem uns com os outros, dentro de um contexto social onde habilidades e competências sociais se desenvolvem a partir da própria interação entre eles. Tudo isso dentro de um ambiente seguro, no qual é possível formular hipóteses para abordagens dos problemas e o erro é permitido.