“Velhice é a única categoria social a qual todos pertencemos ou pertenceremos em algum momento. Lutar contra a velhofobia é lutar pela nossa própria velhice.”
A frase acima é da Mirian Goldenberg, Antropóloga, Pesquisadora e Professora Titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Como a antropóloga aponta, falar sobre a pessoa idosa é falar sobre todos nós. Você já parou para pensar que, se ainda não estamos nessa faixa etária, um dia, se der tudo certo, estaremos? Envelhecer é um processo natural e inevitável, comum a todos os seres vivos. Mas por que a sociedade insiste em esconder, camuflar ou até “corrigir” esse processo?
No Brasil, segundo o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003), é considerada idosa toda pessoa com 60 anos ou mais. Em países desenvolvidos, esse parâmetro muda para 65 anos.
Os estigmas sociais construídos sobre o envelhecimento são tão profundos que muitas vezes nem percebemos quando os reproduzimos. Frases como “ele(a) é jovem de coração” ou “você nem parece ter sua idade” podem soar como elogios, mas, na verdade, reforçam a ideia de que envelhecer é algo negativo, limitante ou de pouco valor. E, muitas vezes, essa visão nasce dentro do próprio núcleo familiar. Quantas vezes já ouvimos, em conversas corriqueiras, expressões como “não tenho mais idade para isso”, “nossa, como fulana envelheceu” ou “idoso é teimoso mesmo”? Essas mensagens, repetidas ao longo do tempo, moldam nosso imaginário coletivo e constroem uma percepção distorcida sobre o envelhecimento.
É justamente a partir desses estereótipos, “brincadeiras” e preconceitos que diferentes formas de violência surgem.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define essa violência como “ato único, repetido ou a falta de ação apropriada, ocorrendo em qualquer relacionamento em que exista uma expectativa de confiança que cause dano ou sofrimento a uma pessoa idosa”.
Segundo a OMS e o Estatuto do Idoso (Brasil), existem diversos tipos de violência contra essa população: Negligência – Quando responsáveis deixam de oferecer cuidados básicos à pessoa idosa, como higiene, saúde, alimentação, medicação ou proteção contra frio e calor. Abandono – Ocorre diante da omissão (familiar, institucional ou governamental) de prestar socorro ou assistência a quem precisa. Violência física – Uso da força para coagir a pessoa idosa a algo contra sua vontade, causando dor, lesões, incapacidade ou até morte. Violência sexual – Inclusão da pessoa idosa em ato ou jogo sexual, com objetivo de obter excitação, relação sexual ou práticas eróticas por meio de aliciamento, violência física ou ameaças. Violência psicológica ou emocional – Comportamentos que afetam a autoestima ou o bem-estar da pessoa idosa, como: xingamentos, sustos, constrangimento, destruição de propriedade ou impedir que veja amigos e familiares. Violência financeira, econômica ou material – Uso impróprio ou sem consentimento dos recursos financeiros, ou patrimoniais da pessoa idosa. |
Diante disso, no Dia Internacional do Combate à Violência contra a Pessoa Idosa, os dados recentes evidenciam a urgência de ações concretas. No Brasil, as denúncias de agressões contra idosos aumentaram significativamente, com quase 50 mil casos a mais em 2023 em comparação ao ano anterior. Entre 2020 e 2023, foram registradas 408.395 denúncias, sendo que 35,1% ocorreram apenas em 2023. (Fonte)
É impossível falar sobre violência sem uma visão interseccional: mais uma vez, as mulheres idosas são as principais vítimas, representando cerca de 70% dos casos, com destaque para negligência, violência psicológica e abuso financeiro como formas mais comuns de agressão. (Fonte)
Reconhecer e rever esses comportamentos é um passo essencial para promover relações mais justas, empáticas e inclusivas. Até porque, como citado anteriormente, se der tudo certo, todos nós chegaremos a essa fase da vida. Muito além de pensar em nós mesmos, é preciso refletir sobre nossa responsabilidade de promover ambientes seguros e respeitosos para todas as pessoas, afinal, somos todos seres humanos que “nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Somos dotados(as) de razão e consciência e devemos agir em relação reciprocamente com espírito de fraternidade.” (Declaração Universal dos Direitos Humanos)
Combater a violência contra pessoas idosas é, antes de tudo, um compromisso com a dignidade humana e com o reconhecimento da riqueza que cada trajetória carrega. Envelhecer deveria ser sinônimo de respeito e acolhimento, não de abandono ou invisibilidade.
Para mudar essa realidade, é fundamental criar espaços de escuta, promover diálogos intergeracionais e fortalecer vínculos afetivos que reconheçam o valor da experiência. É preciso desconstruir preconceitos, enfrentar o etarismo (discriminação e preconceito baseados na idade de uma pessoa) e enxergar o cuidado não como caridade, mas como responsabilidade coletiva. A transformação começa quando olhamos para o outro com empatia e, nesse olhar, enxergamos também o nosso futuro.
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