Passado-se mais de 2 meses isolamento social, resolvemos conversar com várias empresas para saber o que havia mudado desde então, em especial naquilo que toca o Ser-Humano e as relações. Essa reflexão é um resumo de diferentes pontos de vista, tentando ser o mais imparcial possível na descrição do que nos foi dito para então, ao final, compartilhar algumas opiniões e questionamentos próprios.
A primeira e mais citada mudança foi quanto aos preconceitos em relação ao trabalho de casa. Da dúvida sobre a produtividade até a qualidade do trabalho coletivo, muitas empresas alegaram que a crença de que não era possível trabalhar bem com equipes remotas caiu por terra. A eficiência do trabalho, de acordo com algumas pessoas, até aumentou. A pontualidade para os encontros virtuais também aumentou. As reuniões começam e terminam nos horários previstos.
As áreas de treinamento também estão se esforçando para comprovar que é possível desenvolver as pessoas à distância. A experiência de algumas empresas têm sido bem positivas até esse momento.
Com a adoção forçada do home office, outras mudanças vieram na cola. A quantidade de reuniões aumentou, mas o tempo de duração desses encontros diminuiu. As conversas preliminares e informais praticamente não acontecem mais. Há um foco maior no tema ou problema do que antes. Essa diminuição do tempo das conversas é mais significativo nos encontros que não utilizam o vídeo como recurso. Uma pessoa em especial, se referiu a esse fenômeno como “um achatamento das relações”.
Nas empresas em que o uso do vídeo é mais frequente, algumas pessoas relataram um aspecto positivo do trabalho em casa: a possibilidade de “entrar” na casa de colegas, conhecer filhos, esposas, maridos e pets, por exemplo. Para esse público, isso gerou uma sensação maior de proximidade e intimidade, o que ajudou a melhorar as relações de trabalho.
Outro ponto relacionado ao trabalho à distância foi a relação com as lideranças. Algumas pessoas relataram bastante dificuldade com a mudança para o remoto, outras alegaram o oposto. Para todas as pessoas com quem falamos, o que explicava a transição tranquila ou conturbada era a relação com seus superiores e seus respectivos perfis de gestão. Aqueles que já utilizavam métodos descritos como baseados na confiança e responsabilidade favoreceram essa transição mais do que aqueles que, segundo os entrevistados, seguiam uma lógica de microgerenciamento e controle.
Um último ponto relacionado ao trabalho em casa foi a dificuldade gerada pela mistura do contexto profissional com o pessoal, em especial para as pessoas que não tinham o hábito de trabalhar de casa. As principais dificuldades giram em torno da facilidade em perder a concentração, do aumento do número de horas trabalhadas e da dificuldade de organizar e separar as rotinas e tarefas de casa e do trabalho. Tudo isso vem favorecendo variações de humor, maior sensação de cansaço e confusão mental.
Do lado das lideranças, uma queixa bastante presente foi a de conseguir avaliar o bem-estar e a saúde das pessoas. Tanto pela impossibilidade de realizar chamadas com o uso do vídeo, como pela dificuldade em se organizar na nova rotina, conseguir sentir ou perceber como estão as pessoas se tornou mais difícil.
Outro ponto bastante presente nos relatos foi a percepção de que as mulheres, quando têm filhos, estão tendo mais dificuldades para organizar a rotina e dar conta das demandas do que os homens em situação de paternidade. Segundo as pessoas com quem conversamos, há uma tendências das mães assumirem mais responsabilidades nos cuidados da casa e dos filhos do que os pais.
Foi possível perceber um acréscimo de empatia da organização para com uma parte de seus colaboradores. Ao terem que possibilitar o trabalho de casa, algumas lideranças se depararam com o fato de que muitas pessoas não tinham essa opção, fosse pela natureza de suas atividades, fosse pela pouca infra-estrutura dentro de seus lares. Muitas pessoas não possuíam um local adequado, com mesa e cadeira apropriada, ou com um bom sinal de internet.
Na mesma linha do parágrafo anterior, algumas pessoas comentaram que o fato de estarmos todos enfrentando a mesma tempestade facilitou o entendimento de que não é possível separar absolutamente o pessoal do profissional. Pessoas que alegavam o contrário perceberam que a rotina de casa, os medos e ansiedades afetam suas performances.
Por fim, uma última mudança identificada pela maioria das pessoas com quem conversamos foi a preocupação com a saúde mental dos colaboradores. Isso fez com que as empresas olhassem mais para os benefícios oferecidos para esse tema, bem como promovessem mais ações com a finalidade de cuidar deste aspecto.
Dentre os sentimentos presentes mais citados pelos entrevistados, estão o medo – seja do contágio, da morte ou da perda do emprego -, a ansiedade – que não deixa de ser um medo de algo futuro -, a depressão – que geralmente decorre das perdas reais ou simbólicas como a diminuição do como espaço físico limitado, alimentação, falta de sol, redução dos contatos sociais, além de uma série de angústias – que são aqueles sentimentos e sensações difíceis de nomear e relacionar à causa.